21 de janeiro de 2018

APRESENTAÇÃO

A rua Paim vem vivenciando grandes mudanças em sua composição, como todo o resto do bairro da Bela Vista, que compreende do Bixiga ao baixo Augusta. A partir dela observamos o poder estrutural do setor imobiliário e a mudança drástica que ele traz, não apenas para a estética do bairro, mas também impactando diretamente os preços e, naturalmente, a população que consegue permanecer no local.

O conjunto Santos Dumont é hoje um dos últimos vestígios desta última composição arquitetônica (e demográfica) da rua. Um conjunto modernista de 1955, construído pelo arquiteto Aron Kogan, os três edifícios (Demoiselle, Caravelle, e 14 Bis, todos nomeados em referência aos três primeiros aviões do aeronauta e inventor Santos Dumont) carregam um passado complexo, retratando em grande parte a história de uma versão da migração nordestina à cidade de São Paulo.

A nossa porta de entrada de trabalho com os moradores ocorreu por meio do Tarcísio, morador do conjunto há mais de 30 anos. Piauiense e dono do bar da Loja 3, que se encontra na galeria (rua que divide os prédios), no térreo do conjunto ao lado de vários outros bares e lojinhas. Assim que começamos nosso engajamento com o espaço, logo percebemos a forte influência da cultura nordestina no local, presente devido à proveniência da maioria dos moradores. Nosso trabalho em colaboração com o Tarcísio logo se desenvolveu ao redor de algo que salientasse a cultura nordestina, como uma forma de manifestação face às mudanças que vêm ocorrendo na rua, que provaram uma certa negligência em respeito às culturas e histórias existentes no local.

Assim, o trabalho de Lanchonete.org começou a se voltar a um apoio às culturas existentes do conjunto, assim como uma compreensão maior das necessidades e limitações espaciais dos edifícios. Contemplando a ideia de direito à moradia no centro de São Paulo, o projeto desenvolveu durante o ano de 2017 uma série de eventos e debates que experimentavam novas maneiras de se usar o espaço ali existente. Concebido junto ao coletivo norteamericano Amber Collective, o “Museu da Vizinhança” foi desenvolvido em um dos apartamentos localizados no edifício Demoiselle, onde almoços comunitários semanais, oficinas e rodas de conversas, entre outros eventos, serviram como momentos para juntar moradores, visitantes curiosos e parceiros (ativistas, artistas, arquitetos, etc), ao fomentar discussões conjuntas sobre o que compõe este direito ao centro de São Paulo.

Com a finalização do Lanchonete.org como um projeto artístico, no ano de 2018, em parceria com a Escola da Cidade, conduzimos uma aula aberta no Museu da Vizinhança, onde estão sendo elaboradas maneiras de se trazer as dinâmicas comunitárias compartilhadas durante todo o processo de pesquisa para fora. Um exemplo seriapor meio da criação de uma horta comunitária que possa ser usada, a longo prazo, como um espaço comum no térreo do conjunto após o encerramento do Museu.